terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Programa de Restauro Cinemateca Brasileira - Petrobras

Leia abaixo os comentários do blog.

Lançamento da segunda Convocação do Programa de Restauro Cinemateca Brasileira - Petrobras

Dando seqüência ao bem-sucedido Programa de Restauro Cinemateca Brasileira – Petrobras, será lançada no próximo dia 28 de dezembro de 2009, com o apoio da Sociedade Amigos da Cinemateca, uma nova convocação pública para restauração de filmes cinematográficos nacionais. Poderão participar da seleção pessoas físicas ou jurídicas responsáveis por acervos, sempre com a expressa concordância dos detentores dos direitos sobre a obra.

Uma comissão composta por representantes do Ministério da Cultura, da Associação Brasileira de Cinematografia – ABC, da Petrobras e da Cinemateca Brasileira selecionará projetos em duas fases: a primeira levando em conta a importância da obra na filmografia nacional e a urgência em termos de preservação do patrimônio cultural nacional que a intervenção proposta significa; a segunda, após estimativa dos custos de cada solicitação, definindo como serão alocados os recursos disponíveis.

O valor total dos serviços oferecidos pela Cinemateca Brasileira será de R$ 3.000.000,00 (três milhões de reais), a serem integralmente aplicados nos projetos selecionados. Poderão ser submetidas propostas de restauração de curtas e longas-metragens, em 35 ou 16mm, preto e branco ou cores, e a restauração envolverá tecnologia fotoquímica e digital.

Os contemplados receberão ao final do processo uma nova cópia da obra e 20 exemplares em DVD. Como contrapartida, a Cinemateca Brasileira ficará com a propriedade dos materiais de preservação, intermediários, uma outra matriz digital. Ficará, ainda, com os direitos para inclusão da obra nas ações governamentais não-comerciais de difusão do audiovisual brasileiro de modo geral e, expressamente, nas ações denominadas Programadora Brasil, que faz circular filmes brasileiros de diversas épocas e temas, e Banco de Conteúdos Audiovisuais, programa decorrente de parceria estabelecida entre o Ministério da Ciência e Tecnologia e o Ministério da Cultura.

Os filmes restaurados serão entregues em duas etapas, devendo a primeira ser finalizada em novembro de 2010 e a segunda em maio de 2011.

Os projetos pré-selecionados na edição de 2007, que não foram contemplados por questões orçamentárias e que compõem o Banco de Projetos do Programa de Restauro, concorrerão automaticamente na próxima edição, salvo manifestação em contrário.

A partir do dia 28 de dezembro, a convocação na íntegra estará disponível pelo site da Cinemateca Brasileira: www.cinemateca.gov.br. Maiores esclarecimentos poderão ser prestados via e-mail: contato@cinemateca.org.br

COMENTÁRIOS:
Tradicionalmente, as Cinematecas preservam para a posteridade obras que consideram significativas pelas mais diferentes razões e interesses - de ordem estética, histórica, política ou social -, mas quase sempre realizadas por terceiros (cineastas, produtoras, estúdios, orgãos governamentais etc). Obviamente, surgiram também arquivos e filmotecas geralmente ligados a uma instituição e que se dedicavam somente à guardar as obras produzidas por elas mesmas ou do qual eram donos. Por exemplo, os arquivos dos estúdios de Hollywood (como os de Walt Disney, um dos mais bem cuidados dos EUA), os arquivos de determinados orgãos do governo que produzem obras audiovisuais (como o arquivo da Câmara Federal) ou os arquivos de emissoras de televisão (como os da Rede Globo).

Diferentemente destes exemplos, em que o investimento na preservação ocorria em um produto da própria empresa ou instituição, as Cinematecas geralmente dedicavam tempo e recursos para manter e salvar obras que não lhes pertenciam. Dedicavam-se à presevação do "patrimônio audiovisual", um bem comum.

Como é de se esperar, vários problemas surgiam nessa situação, como por exemplo, o caso de uma Cinemateca esforçar-se em restaurar um filme a partir de materiais em péssimas condições - muitas vezes por descaso e negligência do próprio detentor dos direitos - e, feito isso, o mesmo 'dono' da obra simplesmente pegar de volta os materias para explorá-lo economicamente (relançar nos cinemas, telecinar para TV, exibir em festivais etc), e, muitas vez, sem atentar para a necessidade de salvaguardar os materiais de preservação. Ou seja, o trabalho da Cinemateca ia por água abaixo com a obra sendo colocada novamente em risco pela visão a curto prazo de seus donos.

Por esses motivos, os arquivos e a FIAF deteminaram certas regras - ou prerrogativas - para as Cinematecas relacionadas ao 'bom uso' (fair use) dos materias sob a sua guarda e responsabilidade. Desse modo, ao aceitar preservar um determinado material de uma obra com seus próprios recursos (em seus depósitos, com seus funcionários e insumos), a Cinemateca passaria a poder:
1 - Exibir cópias dessa obra em suas próprias salas de exibição (sem objetivo de lucro, mas como ação de difusão cultural) ou emprestá-las para outras Cinematecas, desde que não colocasse a obra em risco (sem exibir cópias únicas ou de preservação), e sem precisar de autorização dos detentores dos direitos.
2 - Teria o direito de realizar, com seus próprios recursos ou de terceiros, materiais de preservação (ex. contratipos ou másteres) das obras depositadas que se destinariam a garantir sua salvaguarda. Mesmo que a utilização destes materiais novos (para dar origem a novas cópias, por exemplo) não fosse autorizada pelos detentores dos direitos, ainda assim eles não poderiam ser retirados da Cinemateca pelo 'dono' da obra ou dos materiais que possam lhe ter dado origem.

O Programa de Restauro Cinemateca Brasileira - Petrobras foge do procedimento tradicional das Cinematecas ao vincular a restauração da obra à cessão (de parte) dos direitos à própria instituição que irá restaurar o filme. Por um lado, pode-se argumentar que essa é a contrapartida do produtor ao dinheiro público que está sendo gasto (embora quem é que aceitaria "ceder" parte da propriedade de sua casa, digamos, tombada pelo IPHAN, em troca de sua restauração pelo poder público?) Por outro lado, a difusão cultural da obra a ser restaurada já está tradicionalmente garantida e o que está ocorrendo é uma barganha maior dos direitos de circulação da obra pelo governo(em seus programas de maior visibilidade, a Programadora Brasil e o ambicioso Banco de Conteúdos Audiovisuais). Vendo de um outro ângulo, uma instituição pública como a Cinemateca Brasileira estaria agindo da mesma forma que um laboratório comercial, exigido alguma forma de 'pagamento' (no caso, a cessão dos direitos de difusão na internet) pelos seus serviços.

Pode-se argumentar novamente que nenhum produtor é obrigado a inscrever seu filme neste Programa, mas dada a dificuldade de se captar recursos ou conseguir a restauração de uma obra fora das instituições responsáveis por este edital (Cinemateca Brasileira e Petrobrás), a barganha pode ser encarada como chantagem. Mas muito estrategicamente essa visão é anulada pelo formato do Programa. Pareceria um absurdo - e realmente uma chantagem - a Cinemateca colocar essas condições para restaurar um filme que está em seus depósitos ou que alguém lhe ofereça, batendo na porta da instituição em São Paulo, mas sob o formato de uma inscrição voluntária num edital, o absurdo não se torna mais tão absurdo.

Talvez, no final,todos fiquem felizes, pois os produtores poderão ter cópias novas de seus filmes para, quem sabe, exibir em mostras e festivais, e DVDs para vender para o Canal Brasil ou TV Brasil, enquanto a Cinemateca e o SAv ampliarão o número de obras que, em breve, disponibilizarão na internet. Ainda assim, as condições deste Programa me parecem merecedoras dessas breves reflexões.

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