sábado, 28 de abril de 2018

Relato da visita ao Kodak Film Lab NY

Viajei para Nova Iorque há algumas semanas para apresentar um filme do LUPA-UFF no 11th Orphan Film Symposium, organizado pela New York University (NYU) e sediado no extraordinário Museum of the Moving Image, no Queens (bem ao lado do histórico Astoria Studios, construído pela Paramount nos anos 1920). O Orphan Film Symposium será o tema de um próximo post, pois este será sobre outro assunto. Dias antes do início do Orphan, o professor e pesquisador da NYU Dan Streible, idealizador e diretor do evento, convidou os participantes do simpósio que estivessem interessados para conhecer as instalações do Kodak Film Lab NY, muito próximo ao Museum of the Moving Image.
Secagem dos negativos
Os interessados foram muitos e acabamos sendo divididos em grupos, uma vez que o laboratório não era muito amplo. Fiz parte do primeiro grupo que se encontrou às 18h00 na frente de um prédio comercial no qual não havia portaria e nenhuma placa ou indicação de que a Kodak funcionasse lá.
Nesse primeiro momento já ficou clara uma característica que marcou toda a visita: o redimensionamento de escala da Kodak, outrora uma gigantesca multinacional que praticamente dominava o mercado mundial de fotografia, para uma empresa de muito menor porte que emergiu da recuperação do pedido de falência há poucos anos atrás.
Descobrimos que devíamos seguir por um longo corredor, passando pela porta de outros escritórios, até chegar ao Kodak Film Lab, onde fomos recebidos por dois simpáticos funcionários que foram nossos guias na visita. Novamente a impressão mencionada se repetiu, pois nosso guia principal, Bob Mastronardi, disse ter trabalhado na Kodak muitos anos, mas depois saiu da empresa (não lembro se mencionou ter sido demitido ou se pediu demissão), tendo retornado mais recentemente.
Segundo Bob nos explicou, o laboratório foi criado há menos de um ano, percebendo que não havia mais nenhuma empresa que realizasse processamento de negativo na região de Nova York, uma vez que a maioria dos laboratórios que ainda existem nos EUA ficam em outros estados. Assim, o Kodak Film Lab NY foi aberto, realizando exclusivamente revelação de negativos coloridos para os produtores, mas não processando cópias, o que é feito pela maior parte de seus clientes em outros laboratórios como a Colorlab. Para uma lista dos laboratórios existentes, vale a pena ver o diretório no próprio site da Kodak.
Os chassis para os negativos não revelados
Fomos levados, então, para ver o laboratório, passando pelo aposento escuro onde os negativos ainda não revelados são colocados nos chassis para serem levados a um das duas máquinas que o laboratório tem em funcionamento. Elas também são capazes de revelar negativos em 8mm e S-8mm a 70mm (na verdade, negativos 65mm, pois só a cópia, com a banda sonora, que é 70mm), mas atualmente eles atendem exclusivamente a 16mm e 35mm. Somente o laboratório da Kodak de Londres (reaberto também há poucos meses, assim como a terceira unidade, em Atlanta) revela 65mm, bitola que tem sido usada em superproduções de Quentin Taratino ou Christopher Nolan. Perguntei quem são os clientes que ainda levam negativos 16mm e me disse que são sobretudo produtores independentes. A maior parte de seus clientes, porém, são produtores de Hollwyood que ainda filmam em película (os cartazes nas paredes revelavam a identidade de seus últimos clientes, como The Post, de Steven Spielberg).
As químicas utilizadas na revelação
Pudemos ver de perto as máquinas e suas partes onde o filme é revelado, processado e depois secado. Nos explicou que anteriormente era muito difícil manter a química equilibrada, mas que atualmente eles já recebem os "ingredientes" em galões com as doses certas: basta misturar dois galões com a solução x com um galão da solução y. Notei que os galões tinham a etiqueta da Eastman Kodak e ele me dissem que eles eram produzidos pela Eastman Chemical, antiga subsidiária do grupo, que foi vendida posteriormente (e ele fez uma cara de que tinha sido um erro da empresa).
Sala de revisão, com limpadoras de ultrassom ao fundo
Vimos em seguida a sala de revisão dos negativos, onde também é avaliada a qualidade do processamento. Ali deu para entender melhor qual é o uso do 35mm pela indústria de cinema e porque surgiu essa demanda para a reabertura de um laboratório em Nova York. Como alguns cineastas ainda prezam a imagem obtida através da película cinematográfica, eles filmam em 35mm e enviam os negativos de câmera, o material bruto, para o laboratório, que revela e imediatamente digitaliza para enviar as imagens de volta para os produtores. Ou seja, tratam-se dos dailies - isto é, o material bruto que é visto pelos realizadores, conforme são feitos, para avaliar o andamento da filmagem.
Anteriormente, segundo nosso guia, a indústria digitalizava tudo já em 2K, mas, diante do tsunami digital que isso vinha provocando, atualmente o procedimento é outro. O negativo bruto é digitalizado em Full HD para visionamento e posterior montagem. Posteriormente, quando o filme já está montado digitalmente, solicita-se ao laboratório que digitalize, em 4K, somente os trechos do negativo em 35mm que serão usados.
O scanner Cintel
O Scanner que o laboratório usa é um Cintel, da Blackmagic, mesmo marca da hoje famosa câmera.
Nesse sentido, há um fluxo intenso entre o laboratório e os clientes, mas ele funciona através de um "escaninho" que cada cliente tem, com chave, onde ele deposita os negativos utilizados a cada dia de filmagem, recebendo depois, através geralmente de um HD Externo, os negativos digitalizados após serem revelados.
Foi uma visita muito esclarecedora, percebendo que, após o quase desaparecimento da película, ela voltou, numa dimensão pequena, mas aparentemente estável.
Meu colega de UFF João Luiz e eu ao fim da visita